domingo, 24 de janeiro de 2010

A psicóloga americana Sharon Franquemont: O mundo é dos visionários...
















Psicóloga americana diz que, no século XXI, o uso da intuição é fundamental para se dar bem no trabalho e no amor.
"A intuição lhe diz o que fazer, sem que você precise usar a razão.
É a parte ilógica da existência".
A psicóloga americana Sharon Franquemont resolveu seguir sua intuição.
Abandonou as aulas de inglês, espanhol e história, que dava a alunos do ensino médio, para ensinar as pessoas a desenvolver a intuição.
Tanto se empenhou que conseguiu transformar a intuição em matéria do curso de psicologia da Universidade John F. Kennedy, na cidade de Orinda, na Califórnia.
Há quase trinta anos dedicando-se ao assunto, hoje Sharon dá dicas de como a intuição pode ser usada para aprofundar relacionamentos, administrar melhor o tempo e tomar decisões com eficiência.
Suas teorias já foram ouvidas por funcionários do governo americano, profissionais da educação e dirigentes de grandes corporações, como Intel, Procter & Gamble e AT&T.
Aos 59 anos, com três filhos e um neto, viaja o mundo desdobrando-se entre consultorias, palestras e treinamentos.
Há pouco tempo, ela esteve no Brasil para lançar o mais recente de seus três livros. Em Você Já Sabe o que Fazer (editora Nova Era, 410 páginas), Sharon recomenda ao leitor praticar uma espécie de fitness da intuição.
"Assim como a visão e o olfato, a intuição é um tipo de sentido.
Quanto mais se usa, mais aguçada fica", afirma.
Sharon deu a seguinte entrevista a VEJA.

Veja – Como a senhora define intuição?
Sharon – Todo mundo, em algum momento da vida, já experimentou a intuição. Ela pode se manifestar sob a forma de uma voz interna, um ato instintivo, um repente de criatividade ou flashes de imagens, que surgem na mente como se estivessem em uma tela de TV. A intuição lhe diz o que fazer, sem que você precise usar a razão. É a parte ilógica da existência. No passado remoto da história da humanidade, o homem valia-se basicamente de seu instinto para sobreviver e se relacionar com o mundo. E o instinto é uma forma primária de intuição. Num determinado momento, passamos a priorizar o uso do intelecto – e fizemos isso de maneira avassaladora. Na minha opinião, o próximo passo da evolução humana é voltar a dar mais importância à intuição.
Veja – Por quê?
Sharon – Hoje em dia, somos bombardeados o tempo todo com uma quantidade inesgotável de informações. Elas vêm de todos os lados e sob as formas mais diversas. Há coisas demais para saber e assimilar. Nossa mente fica sobrecarregada. Não há cérebro que dê conta de tudo isso. Depois de anos de evolução, agora começamos a perceber que algo de bom do instinto humano ficou perdido ao longo desse processo. Não adianta querer compreender tudo apenas com o intelecto. É preciso contar com a ajuda das emoções, da criatividade. No século XXI, a intuição é fundamental. É uma nova forma de inteligência emocional. Nesse campo, os brasileiros levam grande vantagem. São extremamente intuitivos, um dos poucos povos no mundo ocidental com disposição para esse tipo de habilidade – talvez pelo fato de eles serem um povo apaixonado, criativo e desembaraçado.
Veja – Freqüentemente, a senhora é convidada a dar palestras para executivos de grandes empresas. Qual a importância da intuição no trabalho?
Sharon – No ranking das cinco principais qualidades do funcionário ideal, certamente a intuição é uma delas. As grandes corporações já sabem como processar essa quantidade enorme de informações, que chega o tempo todo, de todas as partes do mundo. O que falta, então, às empresas? Faltam pessoas que consigam distinguir, entre tantas informações, qual a que realmente interessa. O staff das companhias também precisa ser composto de executivos visionários, que identifiquem novos caminhos a seguir. A intuição é o talento que está por trás tanto de um caso quanto de outro. As pessoas intuitivas são capazes de enxergar o futuro. Um dos exemplos mais claros do que digo foi o que aconteceu na Ford, em 1980, quando a empresa enfrentava dias difíceis. Na época, o presidente Donald Peterson teve um flash intuitivo: colocar os designers em nível de igualdade com os engenheiros. Com isso, eles levaram o trabalho mais a sério e se empenharam como nunca. Os projetistas foram inspirados a produzir o Ford Taurus, um sucesso histórico de vendas nos Estados Unidos, que reverteu a situação da companhia. A virada da Ford foi fundamental para a modernização do processo de produção da indústria automobilística. Essa história mostra como o simples fato de seguir a intuição pode fazer enorme diferença.
Veja – Existe uma categoria profissional que reúna o maior número de intuitivos?
Sharon – Eu diria que os cientistas e os artistas são os que sabem usar melhor sua intuição. A todo tempo, eles nos dão pistas do futuro e nos trazem novas tendências. São capazes, inclusive, de mudar a forma como o mundo caminha. Mas a intuição criativa, em geral, é muito mais aceita hoje do que algumas décadas atrás. Finalmente, estamos admitindo que grandes descobertas científicas vieram de um sonho, de uma idéia, de um flash de criatividade. Eu não estou descartando a importância do trabalho duro, pesado, do dia-a-dia – obviamente, ele é imprescindível. Os cientistas usam muito a intuição. Atualmente, nos Estados Unidos, médicos e outros profissionais de saúde estão começando a olhar para seus pacientes sob uma nova ótica, menos exata e mais emocional. É cada vez maior o número de profissionais que buscam, além de medicar, entender melhor o que se passa com os doentes que estão a seus cuidados. Acreditam que a intuição pode levá-los a ter uma relação mais estreita com o paciente.
Veja – A intuição é um dom?
Sharon – Não acredito nisso. Somos todos intuitivos. Mas, assim como há pessoas com talento para determinadas áreas, como a música, alguns de nós são afortunados com mais intuição do que outros pelo simples fato de saber como explorá-la. No início de meus estudos, acreditava que cientistas e artistas, por exemplo, eram dotados de uma intuição acima da média, que haviam nascido com aquele dom. Com o tempo, no entanto, percebi que, quanto mais apaixonadas por aquilo que fazem, mais as pessoas são intuitivas. Para mim, Albert Einstein (o físico alemão, criador da teoria da relatividade) foi o intuitivo mais famoso da história. Ele costumava dizer que, antes mesmo de conhecer os problemas, ele já tinha as soluções. Ou seja, as idéias brotavam em sua mente. Por que isso acontecia? Porque, entre outros fatores, Einstein amava o espaço como ninguém. Há relatos que dizem que ele tinha o costume de se imaginar flutuando pelo espaço. Einstein passava horas e horas sonhando com as coisas que amava – alguém que tenha esse costume está aprimorando sua capacidade intuitiva. O importante, o ponto principal, é que é possível exercitar a intuição.
Veja – Como?
Sharon – Em nenhum momento de nossa vida nos ensinam como usar a intuição. É um tipo de habilidade simplesmente ignorado em nosso sistema educacional. Vamos à escola aprender lógica, mas não temos um dia sequer dedicado ao entendimento da intuição. Para desfrutá-la, é preciso se livrar das amarras que nos impedem de ser intuitivos. Infelizmente, fomos educados a não prestar muita atenção a coisas surpreendentes que acontecem e para as quais não há explicação lógica. Por exemplo, você resolve procurar um amigo com quem não tem contato há muito tempo. Ao encontrá-lo, descobre que ele está passando por um momento difícil – como uma doença ou uma separação – e que sua presença é de grande ajuda. Em geral, quando se vive uma situação como essa, é difícil refletir sobre o que aconteceu naquele momento. Mas, garanto, foi obra da intuição.
Veja – A intuição feminina é, como se costuma dizer, maior do que a masculina?
Sharon – Isso não passa de crendice. O que acontece, e isso vale para quase todas as culturas do mundo, é que a mulher sempre teve mais liberdade para desenvolver sua intuição. E, ao usá-la mais, acaba aguçando seu lado intuitivo. É ela quem cuida dos filhos, e a relação entre mãe e filho é uma das mais intuitivas que existem – uma forma instintiva de intuição. Uma mãe sabe quando seu filho está com problema, quando precisa de ajuda e de conforto. Esse tipo de sentimento é produto do tempo que passam juntos. Há um dado curioso sobre o sexo masculino. Os homens se sentem mais confortáveis com a intuição criativa, aquela que soa como inspiração. É como se uma lâmpada se acendesse sobre nossa cabeça. As mulheres, com a emocional. Mas, não importa o tipo de intuição – e isso vale para os dois sexos –, quanto mais você ama alguém ou alguma coisa, mais intuitivo fica sobre eles.
Veja – É comum acontecer de você telefonar para uma pessoa e ela dizer que estava, naquele exato momento, pensando em fazer o mesmo. Isso é intuição?
Sharon – Sem dúvida. É o que chamo de intuição emocional. Repare que ela nunca se manifesta entre estranhos, apenas entre duas pessoas que se conhecem – sejam namorados, amigos ou parentes. Alguém com quem você já tem uma conexão emocional. Recentemente a física quântica fez uma descoberta surpreendente: duas partículas que caminham juntas, quando separadas no espaço, movem-se na mesma direção. É isso que acontece com duas pessoas conectadas emocionalmente. Quando uma delas precisa da outra, a outra sabe. A intuição é um elo entre elas.
Veja – A senhora não acha que a intuição pode ser facilmente confundida com misticismo?
Sharon – Sim. O compositor Richard Strauss, por exemplo, afirmava que suas composições pareciam ser criadas por entidades divinas e onipotentes. Giacomo Puccini, autor da ópera Madame Butterfly, disse que seu trabalho foi ditado, palavra por palavra, por Deus. A intuição não tem nada de divino. É um momento real. Confundi-la com fenômenos místicos, porém, é comum até hoje. Muitas pessoas me procuram achando que eu sou vidente – querem saber sobre o futuro, se vão casar, ganhar dinheiro...
Veja – A ciência já provou a existência da intuição?
Sharon – Pesquisadores da Universidade de Iowa realizaram estudos que mostram que as pessoas que tendem a tomar decisões com base em suas intuições utilizam sobretudo o lobo frontal do cérebro, área ligada à concentração e à capacidade de planejamento. Também já se sabe que há uma resposta física e química do organismo à intuição. O cérebro está dividido em dois hemisférios: o direito e o esquerdo. O direito está ligado às emoções e é onde se acredita estar a sede da intuição. O esquerdo está vinculado ao intelecto. Assim que o lado direito capta uma mensagem intuitiva, o esquerdo se encarrega de racionalizá-la. Nesse momento, o cérebro libera uma série de substâncias que se espalham por terminações nervosas, vasos sanguíneos, coração e pulmões. A intuição é sentida fisicamente, sobretudo na região do estômago. Esse processo foi muito bem descrito por Daniel Goleman, professor de Harvard e autor do livro Inteligência Emocional. Mas isso é só o começo. Posso garantir, com base em meus anos de experiência, que, quando falo de intuição, não estou me referindo a nenhum tipo de superstição ou fenômeno sobrenatural.
Veja – Como saber se aquilo que se sente é intuição verdadeira ou simplesmente algo que se desejaria que acontecesse? Até que ponto o desejo não é uma tinta que colore a intuição?
Sharon – Esse é um dos grandes entraves para que as pessoas consigam desenvolver a intuição. E não há ninguém que possa fazer essa distinção por você. Logo, não há nada melhor que tentar. Quando aprendemos a andar, não nos perguntamos o tempo todo se devemos ficar em pé. Simplesmente levantamos e caímos várias vezes até que uma hora não caímos mais. Tente isso com sua intuição. Assuma o risco. Você pode começar com pequenas atitudes, que não colocarão em risco sua vida pessoal nem seu trabalho. Obviamente, você não deve colocar tudo a perder com escolhas do tipo "minha intuição me diz que devo largar tudo". Aliás, a experiência mostra que a intuição não pede que se faça isso. Mas você pode, por exemplo, perguntar à sua intuição o que deve ser feito primeiro naquele dia. Posso garantir que seu dia ficará, no mínimo, mais positivo. E você, no mínimo, mais intuitivo.
Veja – A intuição falha?
Sharon – Acredito que a intuição sempre nos mostra a verdade. Mesmo que, no fim, você descubra que aquele "algo-me-dizia" se tratava simplesmente de sua vontade de que aquilo acontecesse.
Veja – Existe um limite para usar a intuição?
Sharon – O mais importante é não perder o senso comum. Quando uma pessoa começa a ficar obsessiva com relação à sua intuição, é hora de procurar ajuda. Os jogadores compulsivos acreditam que têm uma intuição acima da média. Na realidade, trata-se de pessoas vítimas de um distúrbio psiquiátrico grave. O mesmo vale para os que se julgam abençoados ou amaldiçoados por ter pensamentos intuitivos. Quando eu dava aulas na universidade, um de meus trabalhos era atender a telefonemas de pessoas que tiveram experiências intuitivas. A maioria delas precisava ter certeza do que viveu. Outras estavam obcecadas por suas experiências, como se elas fossem o único sentido da vida. É fundamental lembrar que a intuição trabalha a seu favor, e não contra você.
Veja – E a intuição para o amor? O que se costuma definir como "amor à primeira vista" é uma experiência intuitiva?
Sharon – Tenho uma posição muito forte a esse respeito. É comum ouvirmos que existe uma alma gêmea e que sua intuição se encarregará de achá-la. Não acredito que a escolha da pessoa com quem você dividirá as mais profundas intimidades deva ser deixada somente a cargo da intuição. No amor, assim como em tudo na vida, a intuição é apenas parte do processo, e não o processo em si. Criar um relacionamento positivo requer trabalho duro. Por outro lado, há uma diferença brutal entre casais que se movem um pouco mais pela intuição e os que simplesmente a ignoram. Conheço um casal que foi a Londres passar as férias. Lá, a mulher teve a intuição de que um dia ela e o marido se mudariam para aquela cidade. Cinco anos depois, ele foi convidado a se transferir e, ela, mesmo tendo de abandonar projetos pessoais importantes em andamento, não hesitou em acompanhá-lo. Ela tinha certeza de que tudo sairia bem, como, de fato, aconteceu. Pura intuição.

Fonte: Veja - Anna Paula Buchalla

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